Para muitos, o cristianismo é tão somente uma experiência de natal. Durante o resto do ano, salvo algumas outras festas cristãs, perdem completamente o espírito de abnegação, de justiça, de simpatia, de amor e de retidão moral que o cristianismo nos ensina.
Todos nós já vivemos muitos natais. Primeiro foram os brinquedos, as muitas luzes, os enfeites especiais das festas. A vida era uma roseira florida. Branca flor da manhã que, em cada Natal, brilhava de luz com as lembranças de uma Belém que foi presépio, nascimento, pastores, anjos, canções, magos e presentes. Isso era o cristianismo para nós.
Depois oa natais trouxeram saudade, cartões com distantes mensagens carinhosas, músicas carregadas de recordações. Trouxeram solidão também. A vida cobriu-se de espinhos, e as brancas pétalas rolaram murchas pelas ruas de vilas e cidades. A vida encheu-se de poluição, de lutas, de violências, de angústias, de dor, de ansiedade e de muitos desvios que nos afastaram do cristianismo de nossos natais.
Incrédulos, os homens já não têm o Natal de Cristo em seus lares. Já não têm o louvor a Deus nem anjos cantando em suas enegrecidas noites de pecado. Já não têm “glória a Deus nas alturas”. Tampouco na Terra têm paz e boa vontade para com os homens. São Lucas 12:13-14. O cristianismo de Natal vai desaparecendo da experiência humana.
A Terra converteu-se em uma estalagem superlotada, sem um lugar sequer para Cristo. Nela não penetra o amor; morreu o carinho. Não existe a compaixão; murchou a bondade. Não há atos de justiça; desapareceu a piedade. Só existe a violência, a injustiça, a maldade, a corrupção, a desconfiança e a vileza. A imoraliddae, de uma forma ou de outra, penetrou na vida de quase todos os seres humanos.
A Terra converteu-se em uma estalagem superpoluída, onde o demônio faz a festa com vícios e com pranto; com misérias e com ódios; com violências e com morte. A Terra não têm a Cristo em seus pesares.
Haverá outro contato vivente dos homens com Cristo? Para responder a essa pergunta, vejamos como foi o primeiro contato que tiveram os homens quando Cristo nasceu. Mais especificamente: que significou Cristo para aqueles que estiveram em contato direto com Seu nascimento - Herodes, os pastores e os magos.
PERTURBAÇÃO E ÓDIO
Herodes, o Grande, embora judeu por nacionalidade e por profissão religiosa, descendia dos idumeus, os antigos edomitas. No ano 125 A.C. João Hircano I conquistou os idumeus e obrigou-os a aceitar a religião judaica e a circuncisão.
Herodes subiu progressivamente a escada do poder: primeiro ingressou na corte do sumo sacerdote Hircano II (63-40 A.C.). Depois foi nomeado Strategus (magistrado-chefe) da Galiléia. Pouco tempo mais tarde, Strategus de Selecíria. A seguir, junto com seu irmão Fasael, foi feito tetrarca da Palestina pelo imperador Antônio (40 A.C.). Por essse tempo os partas invadiram a Palestina. Hircano II e Fasael tentaram a paz com os partas, mas foram traídos. Herodes fugiu para Roma. Ali o imperador romano o nomeou rei da Judéia. No ano 37 regressou à Palestina e, ajudado pelas tropas romanas, conquistou Jerusalém.
Apoderou-se do trono depois de massacrar 45 líderes políticos judeus e todos os membros do Sinédrio, menos um. Depois de conquistar a simpatia de Otávio, conhecido como imperador Augusto, conseguiu que ele aumentasse seu reino, acrescentando-lhe Jericó, Gadara, Gaza, Batanéia, Traconites e Auranites.
Seu espírito sanguinário, imoral e corrompido não se limitou aos crimes políticos. Para legalizar sua presença no trono de Jerusalém, que havia arrebatado aos hasmoneus ou macabeus, casou-se com uma princesa pertencente a essa família real, chamada Mariamne. Entretanto, desconfiava de todos os membros dessa família, e matou a muitos deles. Assassinou a Aristóbulo, irmão da segunda de suas dez esposas, afogando-o em uma fonte de seu palácio em Jericó, depois que ele mesmo o havia nomeado sumo sacerdote. Depois matou Hircano II, avô de sua esposa Mariamne. Esta era a esposa que ele mais amava; contudo, um ano mais tarde, assassinou-a friamente. Pouco depois assassinou seus filhos Aristóbulo, Alexandre e Antipas.
Herodes, embora medroso e iracundo, era um simulador astuto e um usurpador cínico, violento, tirano, cruel e assassino. Sua vida era uma constante imoralidade. Transgredia todos os mandamentos da lei que sua religião judaica respeitava em grau extremo.
Herodes o Grande e seu sangrento palácio de imoralidade contrastavam imensamente com o menino Jesus e Seu presépio de Belém.
Herodes teve todas as possibilidades de alcançar uma experiência cristã e de receber a Cristo como o Redentor do mundo. Recebeu a visita dos magos, compreendeu o conteúdo das profecias que indicavam a data e o lugar do nascimento de Cristo, teve a possibilidade de ir até Belém para encontrar-se com o Senhor, mas ficou encerrado em seu orgulho, em seu espírito sanguinário e em sua imoralidade.
Quando herodes ouviu que Cristo havia nascido, perturbou-se (Mateus 2:3), quiz enganar os magos (verso 8), ficou furioso porque estes não voltaram ao seu palácio (Marcos 2:16) e mandou matar todas as crianças de Belém e arredores (Mateus 2:16). Pouco depois, Herodes morreu (Mateus 2:15).
Herodes nunca se encontrou com Cristo. Perdeu a oportunidade de incorporar em sua vida os princípios que Cristo trouxe ao mundo com Seu nascimento. Para ele o cristianismo foi uma grande perturbação, porque preferiu conservar seu espírito orgulhoso e corrompido. As paixões interiores dominaram-no. Como resultado, sua vida foi uma completa tragédia para ele e para todos os inocentes que morreram sob suas ordens, incluindo as crianças de Belém.
Muitas pessoas do mundo ocidental têm com o cristianismo uma experiência muito parecida com a de Herodes. Conhecem-no, sabem onde está, sabem seu significado, sabem que é a verdade e sabem todos os princípios que ensina. Mas não se aproximam dele. Não o aceitam. Seguem o caminho de Herodes e sofrerão as mesmas consequências de frustração, imoralidade e tragédia.
ACEITAÇÃO E ENTREGA DE SI MESMO
A aceitação dos magos orientais é exatamente oposta à que teve Herodes, o Grande. Ele vivia em Jerusalém, estava a poucos quilômetros de Belém, onde Cristo nasceu. Por outro lado os magos, que possivelmente vinham da Babilônia, tiveram que percorrer uma longa distância para ter uma verdadeira experiência de vida com Cristo.
O texto bíblico diz: “Tendo Jesus nascido em Belém da Judéia, em dias do rei Herodes, eis que vieram uns magos do oriente a Jerusalém.”
Mateus 2:1. Aqui a palavra “magos” identifica pessoas possuidoras de uma sabedoria especial. Esses homens tinham um conhecimento do Messias que Herodes, embora tivesse aceitado a religião israelita, não possuía.
Os magos do oriente eram filósofos. Faziam parte de uma grande e influente classe que incluia homens de nobre nascimento, bem como muitos dos ricos e sábios de sua nação. Entre esses achavam-se muitos que abusavam da credulidade do povo. Outros eram homens justos, que estudavam as indicações da Providência na natureza, sendo honrados por sua integridade e sabedoria. Desses eram os magos que foram em busca de Jesus.” - O Desejado de Todas as Nações, pág. 49.
Enquanto esses homens sábios estudavam as estrelas do céu, contemplavam também a glória do Criador. “Buscando mais claro entendimento, voltaram-se para as Escrituras dos Hebreus. Guardados como tesouro havia, em sua própria terra, escritos proféticos, que prediziam a vinda de um Mestre Divino. Balaão pertencia aos magos, conquanto fosse em tempos profeta de Deus; pelo Espírito Santo predissera a prosperidade de Israel, e o aparecimento do Messias; e suas profecias haviam sido conservadas, de século em século, pela tradição. No Velho Testamento, porém, a vinda do Salvador era mais claramente revelada. Os magos souberam, com alegria, que Seu advento estava próximo, e que todo o mundo se encheria do conhecimento da glória do Senhor.” - Ibidem.
Os magos viram no céu algo semelhante a uma estrela. Não era nenhuma das que eles conheciam. A profecia de Balaão declarava: “Uma estrela procederá de Jacó, deIsrael subirá um cetro.” Números 24:17. Eles compreenderam que essa estrela tinha uma especial importância para eles. “Foram instruídos em sonhos a ir em busca do recém-nascido Príncipe.” - Idem, pág. 50.
Os magos não desprezaram a orientação que Deus lhes enviou pela Escritura e por sonhos. Saíram rumo ao lugar onde havia nascido o Príncipe de Israel.
Para os magos do Oriente, o Natal foi uma visão da estrela de Cristo (Mateus 2:2). Foi uma longa viagem, com todo o sacrifício que impunha, do Oriente para adorá-Lo (verso 2). Foi um testemunho de sua fé, dado ao rei Herodes, aos sacerdotes e ao povo de Jerusalém (versos 3 e 4). Foi uma experiência de “intenso júbilo” (verso 10). Foi um ato de entrega de si mesmos e de suas posses (verso 11). E foi, sobretudo, compreensão, aceitação e obediência à revelação divina (verso 12).
O momento culminante de seu relacionamento com Cristo foi quando, ao entrarem na casa, viram o menino com Sua mãe Maria e, prostrando-se, O adoraram (verso 11), “Através da humilde aparência exterior de Jesus, reconheceram a presença da Divindade. Deram-lhe o coração como a seu Salvador, apresentando então suas dádivas - ouro, incenso e mirra.” - Idem, pág. 53.
Em nossa época existem muitos homens sábios que poderiam tomar o exemplo daqueles que vieram da Babilônia para encontrar-se, humildemente, com Jesus. Quando eles regressaram ao Oriente, levaram consigo o tesouro maior do Cristianismo: a vida de Cristo em sua própria vida. Viver como Cristo viveu, atuar sob os mesmos princípios de conduta que Ele viveu, realizar o bem a todos os que têm necessidade, propiciar uma vida moral em meio à comunidade, mostrar a todos o que significa uma verdadeira experiência cristã, é a maior necessidade de nossos dias. Um cristiaismo vivido, não um cristianismo que procede do passado e que se encerra nas exposições apresentadas nos livros. Um verdadeiro cristianismo que transforma a vida e induz os homens a uma conduta plenamente moral, é o que salvará a presente geração.
AÇÃO OBEDIENTE
Semelhante à experiência dos magos foi a dos pastores de Belém. Eles estavam realizando seu trabalho diário nas colinas próximas a essa cidade. “nas horas caladas, conversavam entre si acerca do prometido Salvador, e oravam pela vinda do Rei ao trono de Davi.” - Idem, pág.39.
Nessas circunstâncias, receberam a visita de um anjo que lhes trouxe a seguinte mensagem: “Não temas: Eis aqui vos trago boa nova de grande alegria, que o será para todo o povo: é que hoje vos nasceu na cidade de Davi, o salvador, que é Cristo, o Senhor. E isto vos servirá de sinal: encontrareis uma criança envolta em faixas e deitada em manjedoura.” Lucas 2:10-12.
O cristianismo para esses humildes pastores, era uma experiência de plena feliciddae, de relação direta com o Salvador e de obediência à revelação que haviam recebido.
Depois, uma multidão de anjos apresentou-se diante deles, louvando a Deus com as seguintes palavras: “Glória a Deus nas maiores alturas, e paz na Terra entre os homens, a quem Ele quer bem.” (Verso 14).
Quando essa maravilhosa visão de anjos terminou, os pastores tomaram decisões imediatas. Resolveram aproximar-se de Belém. Disseram: “Vamos até Belém e vejamos os acontecimentos que o Senhor nos deu a conhecer.” (Verso 15).
Belém significa “casa do pão”. Em Belém encontrava-se o Pão da Vida. Os pastores aceitaram a revelação divina e atuaram imediatamente em harmonia com ela. A ação inclui tudo que um ser humano pode fazer. Por isso, em Belém, contaram a revelação que haviam recebido, e “todos os que ouviram se admiraram” (Verso 18). Depois de verem a Cristo, retiraram-se glorificando e louvando a Deus. O relato sagrado diz: “Voltaram então os pastores glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, como lhes fora anunciado.” (Verso 20).
Para esses homens humildes da sociedade, assim como para os mais importantes que atuaram com humildade, a experiência cristã teve um grande significado. Significou uma modificação em sua rotina diária (verso 8). Significou uma aceitação do Salvador (verso 11). Significou uma participação nos louvores angélicos (verso 13). Significou uma revelação do Senhor (verso 15). Significou uma oportunidade de dar testemunho da mensagem que haviam recebido (veros 17 e 18). Finalmente significou o começo de uma vida para glorificar e Louvar a Deus (verso 20).
SIGNIFICADO PARA O SER HUMANO ATUAL
Pode o ser humano contemporâneo ter uma verdadeira experiência cristã? Certamente. Depende dele. Se tomar a atitude de Herodes, não terá experiência cristã. Somente se pode obtê-la, seguindo a atitude dos magos orientais e dos pastores de Belém.
A vida de nosso mundo se parece muito com a de Herodes, o Grande. Está repleta de intrigas, de violências, carregada de inseguranças, pressionada pela desconfiança e arrastada pelos impulsos imorais.
O ser humano de nossa época aprecia manter a aparência de uma vida religiosa. Pode haver aceitado o Cristianismo e, como Herodes, manter uma ligação formal com o povo de Deus. Mas na realidade sua vida não é regida pelos princípios do cristianismo. Prefere tomar suas decisões baseado em seus mesquinhos, estreitos e terrenais desejos de progresso, de aquisição, de posição social e de prazer. Não aceita o humilde bebê de Belém. Quer uma vida pomposa, sem humildade. Deseja uma existência formalmente atraente, como os Natais: com luzes, enfeites, festas e oportunidades para demonstrar sua própria grandeza pessoal. Deste modo, o homem de nosso tempo não tem cristianismo.
O cristianismo como no caso dos magos do oriente e dos pastores de Belém, não desapareceu. Ainda pode ser experimentado. De verdade. Precisamos experimentá-lo. Esta é uma necessidade diária de todos os homens. O cristianismo não é uma festa de Natal que ocorre uma vez por ano, no calendário cristão. É um modo de vida, inclui a aceitação de Cristo e uma entrega completa de nossa pessoa total a Ele. Esta experiência pode ocorrer a qualquer pessoa e em qualquer momento.
O cristianismo implica o começo de uma nova vida e sua continuação: uma vida nova dedicada a louvar a Deus, a servi-Lo e a obedecer-lhe. Uma nova vida que tenha sentido para nós em forma pessoal e também para a comunidade onde vivemos. Uma vida completamente moral.
O Cristianismo é uma aceitação de Cristo e uma entrega a Deus. É obediência plena a todos os princípios que Deus estabeleceu para a vida humana. Estes princípios abrangem toda a conduta individual e incluem a vida em família e na sociedade. Cristo entregou-Se a Si mesmo em favor da raça humana para perdoá-la, redimí-la e salvá-la. Foi uma entrega de amor redentor. Do mesmo modo, nós devemos entregar-nos a Cristo com o objetivo definido de aceitá-Lo como nosso Salvador, de servi-Lo como instrumento de testemunho e de prestar um serviço desinteressado à humanidade pela qual Cristo Se entregou.
É possível que o ser humano contemporâneo possa viver uma vida livre para amar? Sim. Na medida em que elimine seu sanguinário Herodes interior e em seu lugar permita a existência de humildes e obedientes pastores belemitas, com a luminosa companhia dos sábios, fiéis e adoradores magos orientais. Sim, é possível porque Cristo não abandona nunca ao que O ama. Jamais rejeita a quem O procura. Não deixa sem Sua companhia aquele que, sentindo a solitária tristeza do pecado, sofrendo a angustiosa prisão da imoralidade, recebe-O como Redentor, cheio de afeto e carinho.
Todo ser humano que recupere sua vida cristã estará em condições de viver cada dia uma vida de amor.
Este texto foi extraído do livro “Livre para Amar” Cap. 9, págs 75 à 79 escrito por Mário Veloso em 1984. Editora Casa Publicadora Brasileira e do site sétimodia.
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